Texto: Kessia Carvalho
Após a morte de Mei, sua filha de cinco anos, Kae Suzuki encontra em um mercado de antiguidades uma boneca assustadoramente parecida com uma criança. O objeto passa a ser tratado como parte da família e parece ajudar Kae a superar o luto.
Com o nascimento de Mai, uma nova filha, a boneca é deixada de lado. Mas, quando Mai cresce e começa a brincar com ela, estranhos acontecimentos voltam a assombrar a casa. Cada tentativa de se livrar da boneca falha misteriosamente ela sempre retorna.
Dollhouse explora de forma sensível e perturbadora como o luto pode afetar psicologicamente a vida de alguém e criar traumas profundos e duradouros. Um ano após a morte da filha, Kae ainda sofre com crises de depressão e episódios de dissociação, fugindo da realidade sempre que possível.
A boneca surge como um símbolo dessa negação: ela ocupa o lugar da filha perdida e é incorporada à rotina familiar. Até o marido, em um gesto desesperado de tentar recuperar sua esposa emocionalmente, aceita a presença do objeto e entra na fantasia de que aquela boneca é, de fato, a filha deles. As fotos espalhadas pela casa, incluindo a boneca como parte da família, reforçam esse delírio coletivo.
A dinâmica muda completamente quando Kae engravida e dá à luz Mai. A boneca, que antes representava conforto, é agora descartada e guardada em uma caixa até que Mai, já crescida, a encontra e passa a tratá-la como sua melhor amiga. É a partir daí que o terror se intensifica.
Há momentos que exigem certa suspensão de descrença, como quando a boneca, ao ser retirada da caixa, aparece com cabelos e unhas crescidos, e a explicação dada é de que “as bonecas antigas, feitas com cabelo humano”. Essa justificativa, rapidamente aceita pela personagem, provoca no público uma mistura de estranhamento e ironia.
O terror é construído de forma gradual, com cenas de tensão muito bem dirigidas, que mantêm o espectador alerta e imerso. O filme parece se dividir em três atos bem definidos:O luto e a obsessão de Kae, com um tom mais dramático;A introdução do horror psicológico, com o reaparecimento da boneca e o desfecho paranormal e investigativo, que muda a dinâmica e sustenta o interesse até o fim.
A estética é um ponto forte: a fotografia mais crua e a trilha sonora pontual criam um ambiente incômodo e realista algo que muitos fãs de J-horror apreciam.
Apesar de lembranças inevitáveis de outras produções com bonecas amaldiçoadas, Dollhouse se destaca por sua abordagem emocional e simbólica do luto. A história vai além do susto fácil: ela fala sobre a dor de perder e o perigo de tentar substituir o que é insubstituível.
Um filme que prende, assusta e emociona na medida certa.



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